Crescimento da produção e das exportações aumentaram renda no campo e, após dois anos de restrições com a pandemia, alavancaram grandes eventos no Brasil
As grandes feiras do agro devem quebrar um recorde histórico em setembro: mais de R$ 50 bilhões em negócios em um único ano. A marca passa pelo resultado da Expointer, que começa neste sábado, 26, em Esteio (RS). Desde janeiro, os maiores eventos do país já movimentaram R$ 45,13 bilhões – 126,1% a mais do que em 2019, antes da pandemia.
O cálculo leva em conta valores corrigidos pela inflação de cinco feiras já realizadas neste ano. Só a Agrishow, em Ribeirão Preto (SP), registrou R$ 13,33 bilhões em negócios – 3,5 vezes mais do que a edição de quatro anos atrás. As demais também tiveram recorde em 2023: Show Rural Coopavel (R$ 5,12 bilhões), em Cascavel (PR), Expodireto Cotrijal (R$ 7,15 bilhões), em Não-Me-Toque (RS), Tecnoshow Comigo (R$ 11,28 bilhões), em Rio Verde (GO), e Bahia Farm Show (R$ 8,25 bilhões), em Luís Eduardo Magalhães (BA).
No ano passado, estas cinco feiras e a Expointer somaram R$ 47,45 bilhões em negócios – marca que quase foi superada antes mesmo do início da feira no Rio Grande do Sul. O bom desempenho dos grandes eventos agropecuários tem dois motivos: o crescimento expressivo do setor nos últimos anos e o fim da pandemia.
Na safra 2022/2023, a previsão é de que o Brasil tenha uma produção recorde de grãos, com 320 milhões de toneladas segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) – 29,67% a mais do que no ciclo 2018/2019. No mesmo período, a área plantada deve crescer 23,82%, para 78,33 milhões de hectares.
Ao mesmo tempo, as exportações do agro aumentaram durante a crise do coronavírus. Em 2019, o setor faturou US$ 96,85 bilhões. No ano passado, chegou a US$ 159 bilhões – aumento de 64,26%. E o movimento segue ascendente. Em 2023, o faturamento em dólar cresceu 4,5% no primeiro semestre, puxado pela alta de 14% no volume embarcado, segundo o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea).
Expointer deve confirmar recorde
A previsão do governo do Rio Grande do Sul, que organiza a Expointer, é que a feira movimente até 3 de setembro mais do que os R$ 7 bilhões de 2022.
“Há bons indicativos para um desempenho ainda maior, tanto em público quanto em negócios. Acreditamos nisso levando em conta indicadores das outras feiras, que ampliaram os números”, projeta Giovani Feltes, secretário estadual de Agricultura.
Apesar de o estado vir de três problemas com a seca nos últimos quatro anos, Feltes aposta no bom desempenho da atual safra de trigo e na perspectiva de queda de juros como fatores que podem estimular o produtor a investir.
“Além disso, o cenário de pandemia controlada, o avanço do agro nos últimos anos e a magnitude de um evento como esse também mexem com as pessoas de forma anímica, estimulando a confiança”, analisa.
No embalo das máquinas
Segundo a Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), os negócios nas feiras agropecuárias representam cerca de 40% das vendas de máquinas agrícolas do Brasil.
“Os eventos são um instrumento poderoso para fechar negócios, pois o produtor pode ver de perto diferentes marcas e ofertas no mesmo lugar. É uma oportunidade que, somada às promoções, atrai muito interesse”, avalia Pedro Estevão Bastos, presidente da Câmara Setorial de Máquinas e Implementos Agrícolas da Abimaq.
Ele observa que o aumento da área plantada no país exigiu mais maquinário para dar conta da demanda – e o produtor estava capitalizado porque teve alta rentabilidade durante a pandemia diante da valorização das commodities.
O resultado foi uma alta no faturamento com a venda de máquinas agrícolas de 17,7% em 2020 e 42,5% em 2021. “Além disso, o juro caiu a ponto de termos uma taxa Selic de 2% nesta época. Isso criou uma janela ideal para investir”, ressalta.
Após novo crescimento de 2021 para 2022 (+1,8%), chegando a R$ 91,7 bilhões, o faturamento do setor de máquinas tende a cair em 2023, segundo Bastos, por causa do juro mais alto e da menor rentabilidade do produtor diante da valorização do real perante o dólar.
“Tivemos uma sequência muito positiva, então, essa queda é natural, até porque o produtor não compra máquina todo ano. Mas estamos crescendo ano a ano desde 2017 e dobramos o faturamento comparado a 2016”, afirma.
Do entretenimento aos negócios
Outro motivo que transformou as feiras do agro em uma fonte de negócios bilionários foi a própria dinâmica dos eventos.
“Há alguns anos, havia um tremendo foco em entretenimento e gastronomia, com programações também à noite. Isso mudou anos atrás para um funcionamento em dias de semana, fechando às 18h, com prioridade para tecnologia e negócios”, pontua Dilvo Grolli, presidente da Coopavel.
A cooperativa paranaense organiza desde 1989 o Show Rural Coopavel, que só neste ano reuniu 600 empresas, recebeu 384 mil visitantes e movimentou R$ 5,12 bilhões em valores corrigidos pela inflação – aumento de 78,4% comparado com a edição de 2019.
Grolli também atribuiu à expansão do agronegócio brasileiro, com suas peculiaridades regionais, o aumento do interesse pelas feiras.
“Tudo é uma questão de clima e solo, pois cultivar no Centro-Oeste não é igual no Sul e assim por diante. Creio que vão aparecer ainda mais feiras para cobrir todas as regiões do país, pois isso é uma necessidade para o próprio agro crescer cada vez mais”, analisa.
Edição extra no inverno
O bom desempenho das feiras, inclusive, fez a Coopavel criar uma edição extra no meio do ano. O Show Rural de inverno estreou em 2020, em meio à pandemia de coronavírus. Nesta semana, chegou à 4ª edição com mais de 40 empresas e 36 mil visitantes.
“O foco principal é o trigo, cuja produção vem crescendo de forma expressiva nos últimos três anos. Mas o evento traz inovação e tecnologia para outras culturas como cevada e triticale. É para um público específico, criando um espaço exclusivo e pioneiro para as safras de inverno. Hoje, o produtor não pode mais pensar na propriedade como algo que funciona apenas no verão”, afirma Dilvo Grolli, presidente da cooperativa.
Grolli ainda destaca que a edição de inverno ainda não tem venda de máquinas, pois seu objetivo é compartilhar conhecimento técnico e conectar produtores, especialistas e empresas.
“Neste ano, o público foi três vezes maior do que no ano passado. E queremos aumentar ainda mais em 2024, com mais espaço para gado de leite, por exemplo, que é uma opção relevante para o pequeno produtor”, afirma.